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Após 52 anos, Ford encerra produção em São Bernardo

Hoje, último dia, cerca de 650 funcionários serão demitidos;

negociação com a Caoa passa por entrave com o BNDES


Após 52 anos de atuação no Grande ABC, a Ford encerra hoje a produção de caminhões e, consequentemente, toda a sua atividade industrial em São Bernardo. Cerca de 650 trabalhadores do chão de fábrica serão demitidos, ainda sem uma definição sobre o futuro comprador da unidade, já que as negociações chegaram a um impasse – a ideia era a de que eles fossem absorvidos pela nova operação. A planta, que chegou a manter 12 mil

empregos em 1987 e fabricou modelos icônicos como o Corcel, o Del Rey e o Escort XR3, no início do ano tinha 2.800 trabalhadores.


Ontem, foi realizada na porta da fábrica a última assembleia do SMABC (Sindicato dos Metalúrgicos do ABC) direcionada aos trabalhadores da montadora norte-americana. O sentimento era de tristeza e apreensão, mas, mesmo em meio às dificuldades, os colaboradores não perderam as esperanças de continuar trabalhando na fábrica do bairro Taboão, onde a maioria dedicou décadas dos anos de vida (leia abaixo).


Apesar da expectativa de que o grupo brasileiro Caoa assuma a unidade, conforme compromisso firmado em setembro, após a assinatura de protocolo de intenções no Palácio dos Bandeirantes, as transações seguem indefinidas.


O entrave estaria no pedido de empréstimo ao BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) para a aquisição da planta. “Hoje (ontem) falei com o presidente do conselho de administração do Grupo Caoa, o Carlos Alberto de Oliveira Andrade. Ele afirmou que as negociações estavam bem encaminhadas e praticamente finalizadas, mas o BNDES informou que o valor seria apenas para (novos) investimentos e não aquisições”, disse o prefeito Orlando Morando (PSDB). Segundo Morando, o assunto não está encerrado e ele conversa diariamente com o empresário, mas admite que a demora no desfecho “cria uma ansiedade maior” e reconhece “que a angústia aumenta nos trabalhadores”. Mesmo com o contratempo, o prefeito afirmou que as tratativas estão encaminhadas e concentradas na Caoa.


Na última semana, em visita à região, o governador João Doria (PSDB) afirmou que, caso a negociação com o grupo brasileiro não se concretize, um plano B seria a negociação com montadoras chinesas. Anteriormente, o secretário estadual da Fazenda e Planejamento Henrique Meirelles (MDB), revelou que a Caoa ainda não havia conseguido financiamento suficiente para a compra. A transação é estimada em R$ 1 bilhão por fontes do mercado.

A análise do presidente do sindicato, Wagner Santana da Silva, o Wagnão, conforme foi dito na assembleia, é de que a motivação para o entrave seja política. “O que existe hoje é um interessado de fato (na aquisição da fábrica), que é a Caoa, que já tem recursos destinados à compra, mas depende de empréstimo do BNDES para complementar o montante. E o BNDES tem recursos para isso, o que falta é uma decisão política de alguém fazer. Não sei se estão achando que é recurso para São Bernardo, terra do Lula (ex-presidente da república) e do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, e estão colocando impedimento político nesta história, porque não há outra explicação”, afirmou.


Conforme o sindicalista, inclusive já foram feitas reuniões com o grupo para tratar do assunto. Inicialmente, a Caoa absorveria 850 trabalhadores para a produção de caminhões, porém, a expectativa é a de que a montadora também fabrique dois novos modelos de automóveis, ou seja, esse volume de profissionais pode aumentar. Os salários seriam até 30% menores do que os trabalhadores recebem na Ford. “Existe o compromisso da Caoa de fazer a seleção entre os ex-trabalhadores da Ford”, assinalou.


“Fizemos o possível para não chegar nesse ponto, o que já tinha chances de acontecer nos anos 2000, e conseguimos evitar. Em 2001, fomos para os Estados Unidos e conseguimos cinco anos de estabilidade, e nesse período nasceu o Novo Ka. A gente lutou muito. Eu sinto muito pela região que vê uma gigante fechando em momento que estamos com índice de desemprego elevado, e isso tem rebatimento para fora daqui. Se a Caoa entrar é um alívio e minimiza os impactos, mas é uma tristeza”, afirmou o presidente do TID Brasil (Instituto Trabalho, Indústria e Desenvolvimento), que também participou das

negociações, Rafael Marques. Sobre a saída da montadora, Wagnão afirmou que se coloca no lugar de cada trabalhador, que é quem terá a maior perda. “Há prejuízo para o sindicato e para a região, mas o maior é para cada trabalhador. A média para se recolocar

no mercado de trabalho é de 52 semanas, ou seja, é pelo menos um ano desempregado.”


O governo do Estado afirmou que acompanha as negociações, mas que as tratativas são feitas pelas duas empresas privadas. A Caoa informou que, por enquanto, ainda não há mais informações sobre as negociações. A Ford confirmou o encerramento da produção para hoje, e disse que irá se manifestar oficialmente hoje sobre esse tema. Administrativo fica até março no local Na última assembleia realizada na Ford, na manhã de ontem, o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC também informou aos trabalhadores que toda a parte

administrativa da unidade será transferida para o bairro da Vila Olímpia, em São Paulo, onde a Ford está desenvolvendo um novo centro administrativo. Isso deve acontecer em março de 2020.


Desde o anúncio do fechamento da unidade, em fevereiro, 1.200 funcionários já foram dispensados. Toda a produção será dispensada hoje, após a produção do último caminhão a unidade, o que deve acontecer no período da tarde. Conforme negociado

entre a empresa e a entidade representativa dos trabalhadores, os colaboradores dispensados vão receber indenização de dois salários por ano trabalhado.


“Essa é uma assembleia de despedida de cada um de vocês como trabalhadores da Ford, mas nós não desistimos dessa história”, afirmou o presidente da entidade Wagner Santana da Silva, o Wagnão. O sindicalista também lembrou, durante sua fala, que além dos operários que ficaram desempregados na montadora, há reflexo em toda a cadeia. “Para cada um de vocês aqui há cerca de cinco trabalhadores no setor de autopeças,

fornecedores e serviços”, afirmou.


A Prefeitura de São Bernardo pleiteou à GM (General Motors) e Mercedes-Benz para que haja contratação prioritária dos ex-trabalhadores da Ford em caso de processo seletivo. Além disso, o CTR (Central de Trabalho e Renda) da cidade possui balcão de atendimento exclusivo para os trabalhadores da unidade.


Estimativa feita no início do ano pelo Conjuscs (Observatório de Políticas Públicas, Empreendedorismo e Conjuntura) da USCS (Universidade Municipal de São Caetano) é de que sem a Ford, somados recolhimento de impostos aos salários dos trabalhadores, deixem de circular, por ano, R$ 264,4 milhões na região. Trabalhadores seguem com esperança Mesmo com o sentimento de tristeza ao assistir a última assembleia direcionada aos trabalhadores da Ford, os colaboradores que ainda trabalham hoje mantêm a esperança de contratação na futura empresa. A Caoa deve absorver, inicialmente, 850 ex-colaboradores da Ford.


O funcionário da estamparia Valcir Aparecido Languer, 48 anos, sendo 24 de empresa, está a quatro meses de se aposentar. “Sempre foi o sonho de todos os metalúrgicos se aposentar numa montadora”, lamentou.


Mesmo assim, ele espera ser contratado pela nova empresa. “Eu sou metalúrgico e o que eu sei fazer é trabalhar. Eu monto carros. Eu faço peças. Agora, como vou cair em um mercado aí fora? Vou sofrer muito mais. Então, que seja bem-vinda a Caoa, nós temos qualificação suficiente para trabalhar aqui”, completou.


Até mesmo os trabalhadores dispensados acompanharam a assembleia. Caso de Leonardo Otero Cischim, 40, que atuou por 11 no setor de qualidade. Ele foi dispensado em julho e, desde então, não foi chamado para nenhuma entrevista, apesar de ter mandado inúmeros currículos para outras empresas.


“Esperamos que a Caoa, ou qualquer outra empresa que assuma reconheça a nossa qualificação nesse tempo que tivemos de Ford. Temos esperança e fé de que as negociações se concretizem”, disse.


O líder de time Moacir Maia Sobrera, 45, trabalhou na fábrica por 24 e afirmou que está feliz por ter feito parte da história da Ford. “É um sentimento de alegria por tudo o que conquistei graças à empresa, e de tristeza pelo fato de ela estar fechando. É uma companhia que poderia estar crescendo e dando a oportunidade para jovens trabalharem dentro de uma multinacional. Porém, eu aprendi muito e fiz muitos amigos aqui”, avaliou ele.  


Fonte: DGABC 30/10/2019

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